quinta-feira, 30 de maio de 2013

Brasil: O impacto do ENEM no trabalho dos professores

Emanuela Carvalho

O ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) foi criado em 1998, no governo do então Presidente Fernando Henrique Cardoso, com o objetivo de avaliar a etapa final da Educação Básica no Brasil. O exame seria aplicado ao final do Ensino Médio (equivalente ao Ensino Secundário em Portugal) e teria também a função de dar acesso aos programas de financiamento estudantil, como o PROUNI.

Ao longo dos anos, o ENEM sofreu significativas mudanças, entre elas, passou a ser aceito como forma de ingresso nas universidades, depois de uma estratégia do Ministério da Educação, que modificou a sua proposta, para que ele fosse aceito como forma de ingresso, substituindo o vestibular, parcial ou totalmente. Com o passar do tempo, as universidades particulares também aderiram ao ENEM, o que fez aumentar consideravelmente o número de alunos interessados em participar da avaliação.

Outra mudança importante é que o exame passou a ser utilizado para a formação dos rankings, apresentando as “melhores” escolas. Desta forma, as instituições, preocupadas em estar bem colocadas nesta lista, passaram a investir na preparação dos seus alunos, repensando conteúdos, planejamento, atividades docentes em função do ENEM. Os professores, que há anos preocupavam-se em preparar os alunos para o vestibular, sentem hoje a necessidade de preparar os alunos para o exame, já que além de dar acesso às universidades, eles demonstrarão, através dos números, quais são as melhores escolas. E não é só o trabalho docente que sofre os impactos. A própria gestão da escola organiza-se em função do exame, já que são aplicados simulados e oferecidas atividades específicas que mudam a rotina da escola.

O que os professores pensam da “interferência” do exame nos seus trabalhos? Ainda é cedo para saber. Mas a minha curiosidade e interesse pelo tema me levarão a questioná-los e, quem sabe, a encontrar essa resposta e tantas outras que nos levem a entender as possíveis consequências do impacto do ENEM no trabalho docente e na Educação do Brasil.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Leitura literária e formação do leitor em Portugal

Danieli Tavares

O ensino da leitura literária e a formação de leitores na escola portuguesa no 1.º ciclo do ensino básico ainda divergem-se do ideal. Alguns exemplos de medidas ministeriais referentes à implementação da entrada do livro de literatura infantil na escola compõem: a) a Rede de Bibliotecas Escolares (RBE), criada pelo Despacho Conjunto n.º 43/ME/MC/95, de 29 de dezembro, cujo objetivo consistia na instalação de bibliotecas escolares nas escolas de todos os níveis de ensino; b) a legislação que regulamenta a figura do professor bibliotecário (Portaria n.º 756/2009 de 14 de julho), posto que Portarias posteriores (n.º 558/2010, de 22 de julho, n.º 76/2011, de 15 de fevereiro) induziram limitações às funções do professor-bibliotecário; c) o programa Plano Nacional de Leitura (PNL), lançado em 2006 e que simbolizou um novo impulso à leitura; d) o Programa Nacional de Ensino do Português (PNEP), criado pelo Despacho n.º 546/2007, de 11 de janeiro, que, em período posterior teve continuidade através do Despacho n.º 29.398/2008, de 14 de novembro no âmago da melhoria dos níveis de desempenho dos alunos do 1.º ciclo do ensino básico em relação às competências oral e escrita, em língua portuguesa.
Não descartamos a ideia de que os programas viabilizam o alcance dos livros na biblioteca escolar pelas crianças do 1º ciclo. A questão que se coloca é se as instruções dos documentos para os professores em relação à leitura na sala de aula correspondem ao objeto estético ao mesmo tempo em que mantém o seu aspecto social ou, mantém-se compartimentada nos processos armadilhados de leitura, assumindo utilidade eminentemente pedagógica no âmbito escolar.
Embora os dispositivos legais destaquem o ‘ensino de leitura literária’ com ênfase à oralidade, expressão e compreensão, reclamam uma prática pedagógica nos “descaminhos” do instituído. A literatura para infância ausenta-se de estimular a consciência crítica dos alunos do 1º ciclo (e não só) e incorporar valores reformulados em meio aos fios plurais que tecem a relação literário-pedagógico nas atividades de leitura em sala (e fora dela). Afinal, a literatura para crianças não é um simulacro do livro didático. É, para além disso, uma multiplicidade de sentidos.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

O museu como sala de aula

Rooney Figueiredo


O museu é antes de tudo uma cápsula do tempo com o conforto do presente. É um espaço único que nos permite viajar ao passado com as comodidades dos dias atuais. O portal para estes mundos, por vezes dicotômicos, pode ser um mosaico romano, uma escultura em pedra, um túmulo medieval ou uma talha barroca.

Olhar para o passado protegido nos museus é um luxuoso aprendizado. Um professor pode ir ao museu com seus alunos quantas vezes for possível. As diferentes áreas do conhecimento podem explorar este espaço e construir aulas dinâmicas, eficientes e sobretudo divertidas.

Uma aula no museu pode ser algo dinâmico e envolvente, mas sabemos que tudo depende de como orquestramos a aula. Ir ao museu com os alunos, em horário de aula, não é um passeio, é aula. Sendo aula, é preciso ter plano, roteiro e objetivos claros para o professor e mais ainda para os alunos. Não precisa ser um momento de chatices, desconfortável e pouco estimulante, mas sim um evento na altura da riqueza desta fabulosa cápsula do tempo que recebe aluno e professor.

Cada peça exposta em um museu tem uma história e algumas possuem incríveis curiosidades. Seria um desperdício não usar tais curiosidades como ferramentas didáticas. O museu como sala de aula é uma estratégia que ensina muito mais que os conteúdos de uma cadeira, transforma aluno e professor em guardiões de um tesouro, de um espaço único com uma riqueza singular da qual todos somos herdeiros.

Não explorar o museu como sala de aula é como ir à uma praia de um país tropical e não dar um mergulho: sentimos o sol, mas não nos refrescamos na água.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Os desafios do “Alargamento da Escolaridade Obrigatória”

Maria da Luz Pereira Pedroso

Quando a Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, foi publicada, estava em questão o estabelecimento da idade escolar entre os 6 e os 18 anos, ou seja, implicava o alargamento da escolaridade obrigatória ao ensino secundário. Com a sua implementação através do Decreto-Lei n.º 176/2012, de 2 agosto, é referido no seu preâmbulo que o “alargamento da escolaridade obrigatória constitui, neste momento, um dever do Estado que tem de ser harmonizado com o dever da frequência da escolaridade que recai sobre os alunos. Resulta, assim, num conjunto de deveres recíprocos do Estado, da escola, do aluno e da respetiva família. A responsabilização dos alunos e das famílias, através dos pais e encarregados de educação, constitui igualmente um aspeto fundamental neste novo regime que se estabelece” (DR, 1.ª série-n.º 149, p. 4068).

Tendo em conta o referido anteriormente e o reconhecimento de algumas das vantagens do alargamento da escolaridade obrigatória, como o aumento dos níveis de literacia da população, esta Lei traz contudo às escolas e à comunidade educativa novos questionamentos, que se estendem ao meio académico e a outras entidades públicas e privadas com responsabilidades sobre as instituições escolares, especialmente sobre as potencialidades e os constrangimentos deste alargamento.

Tendo em conta a crise económica e financeira, as reformas do Estado, na sequência das sucessivas avaliação da Troika, e os dados mais recentes de entidades que tutelam o bem-estar de crianças e jovens, e suas respectivas famílias, como a Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, os Centros Educativos, a Equipa Multidisciplinar de Assessoria ao Tribunal, a Direcção-Geral de Reinserção Social, a Polícia de Segurança Pública (Programa Escola Segura), entre outras, acreditamos, de facto, que a escola pública ainda não é para todos. Estamos, por conseguinte, longe de conseguir cumprir a meta de Bruxelas, de redução da taxa de abandono escolar precoce em 10% até 2020, na União Europeia.

Entendemos, por isso, ser urgente uma reflexão plural entre diversos atores educativos e sociais, a fim de se debaterem as questões relacionadas com o alargamento da escolaridade obrigatória, nomeadamente os desafios previstos, o alcance das mudanças e os potenciais problemas que se colocarão às escolas/agrupamentos, às famílias e ao Estado, para que dessa forma todos sejamos co-responsáveis nesse processo.