António
Gomes Ferreira
Cada
vez mais se vem insistindo na relevância da educação formal
atender aos supremos interesse da ciência. Mas este apelo a uma
instrução meramente instrumental não é nova, colocou-se ao longo
da história da escola, apenas reequaciona a questão dos conteúdos.
Por outro lado, é preciso questionarmos se a educação formal não
se deve importar com o modo como olhamos e utilizamos a ciência, se
isso não é tão culturalmente relevante e não tem consequências
para a qualidade de vida das pessoas. Educação é sempre resultado
duma relação e esta é sempre dependente de condições históricas
e culturais. A definição do conteúdo, o interesse do objeto, a
circunscrição do científico, ao contrário do tantas vezes se diz,
não dependem apenas da primordial qualidade da parcela de matéria.
Nenhuma substância é só por si interessante para a ciência e a
cultura. Quem confere importância é o homem ou a mulher no modo de
olhar, analisar e compreender qualquer matéria ou dimensão da
realidade. Mas estes não o fazem isolados, individualmente, antes
agem a partir das relações que desenvolvem com as condições
materiais e da capacidade técnica que está disponível. Mas, mesmo
assim, a capacidade de delimitarem a relevância da ciência a
ensinar não está ao alcance de todos os homens e de todas as
mulheres. Ignorar quanto este exercício está dependente de forças
dominantes que estão fundamentalmente preocupadas com a reprodução
da sua lógica de poder, é ingénuo e impede de equacionar a
capacidade de transformação da educação. Não se nega a
importância da apropriação do conhecimento rigoroso e consolidado,
nem a conveniência de se organizar um sistema educativo estruturado
tendo em vista a melhoria tecnológica e o bem-estar das pessoas.
Todavia, é preciso tomar consciência de que há mais saber
relevante para além do necessário domínio da técnica, da
aplicação instrumental do rigor. Ganharemos mesmo mais eficiência
se soubermos promover uma educação que olha criticamente para o
conhecimento científico, que se atreva a fazer pensar sobre o uso da
ciência, sobre o sentido do progresso, sobre o que deve ser o
humano, sobre as consequências do que fazemos e devíamos fazer, do
que devíamos ser.
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